Resistência insulínica: o começo de quase tudo

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Existem quatro doenças que mais ameaçam nossa longevidade: doenças cardiovasculares, câncer, doenças neurodegenerativas e doenças metabólicas. Peter Attia chama essas ameaças de os Quatro Cavaleiros — uma referência direta ao livro de apocalipse da Bíblia. E entre elas, a mais difícil de definir são as doenças metabólicas.

Não têm uma delimitação clara, englobam diversas condições, mas têm atraído a atenção de cientistas, médicos e empreendedores. E muita inovação está acontecendo: dos agonistas de GLP-1 aos sensores contínuos de glicose.

Por trás de todo esse movimento, existe um marcador silencioso, ainda pouco reconhecido por muitos, mas que pode prever, com anos de antecedência, o colapso metabólico: a resistência insulínica.

Ela está no centro da disfunção cardiovascular  e cada vez mais conectada ao câncer e à neurodegeneração.

O que é insulina e por que ela é tão importante?

A insulina é um hormônio produzido pelo pâncreas. Sempre que comemos, especialmente alimentos ricos em carboidratos como pão, arroz, massas e doces, o corpo transforma parte desse alimento em glicose, um combustível das nossas células.

Quando a glicose entra na corrente sanguínea, o pâncreas libera insulina. Pense nela como uma chave que abre as portas das células para que a glicose possa entrar e ser usada como energia.

Sem insulina, a glicose fica “presa” no sangue, sem conseguir entrar nas células, e isso, ao longo do tempo, é muito perigoso, levando eventualmente à famosa diabetes tipo 2. Lembra do exame de glicose? Ele mede exatamente o quanto de glicose está circulando no sangue naquele momento.

Mas a insulina vai além do açúcar no sangue. Ela, entre outras coisas, também:

  • Ajuda o corpo a armazenar energia extra, transformando glicose em gordura para uso futuro

  • Impede que o fígado produza mais glicose quando os níveis já estão adequados

  • Participa do metabolismo de proteínas e gorduras, contribuindo para a construção e reparo dos tecidos

O que acontece quando o sistema falha — quando a “chave” enferruja

A resistência insulínica acontece quando as células do corpo deixam de responder bem à insulina. A insulina continua sendo produzida, mas a “chave” já não abre as portas com a mesma eficiência, ou melhor, é a fechadura que começa a travar.

O pâncreas, tentando compensar, começa a produzir cada vez mais insulina para manter a glicose sob controle.

Essa fase pode durar anos — ou até décadas — e é silenciosa. Por isso, exames tradicionais que medem glicose (como glicose de jejum e hemoglobina glicada) continuam “normais”, enquanto por dentro o sistema já dá sinais de sobrecarga.

Vamos a um exemplo:

Imagine duas pessoas com glicemia de jejum “normal” — digamos, 88 mg/dL.

A primeira tem insulina de jejum de 6μU/mL. A segunda, de 20μU/mL. Se olharmos apenas a glicose ou a hemoglobina glicada, tudo parece bem.

Mas a segunda pessoa já vive com hiperinsulinemia compensatória — sinal claro de resistência insulínica. Ou seja, precisa produzir muito mais insulina para manter a glicose em níveis adequados. 

Como alerta a Dra. Casey Means:

“A tragédia absoluta do nosso sistema de saúde atual é que um médico (que só mediu a glicose) dirá a essa pessoa (a segunda) que ela está bem e normal.”

Como saber antes?

O padrão-ouro para medir resistência insulínica é o chamado clamp euglicêmico — um exame sofisticado, caro e impraticável na rotina clínica. Por isso, precisamos recorrer a marcadores mais acessíveis, disponíveis em qualquer laboratório.

Segundo o Dr. Ralph DeFronzo, uma das maiores autoridades mundiais em metabolismo, alguns exames simples já oferecem pistas valiosas — mas ainda são pouco utilizados na prática.

  • Insulina de jejum: idealmente abaixo de 6 μU/mL. Valores persistentemente acima disso sugerem resistência insulínica.

  • HOMA-IR: índice muito fácil de fazer a conta que combina insulina e glicose de jejum. Acima de 2 já indica alerta. (Glicose em jejum (mg/dL) × Insulina em jejum (μU/mL)) / 405

  • Relação triglicérides/HDL: quanto maior, maior o risco. Acima de 2 é sinal clássico de resistência.

  • Esteatose hepática (gordura no fígado): identificada por ultrassom, é um marcador precoce de sobrecarga metabólica.

  • Sinais clínicos: gordura abdominal persistente, fadiga após refeições, apetite desregulado.

  • Histórico familiar: presença de diabetes tipo 2, gordura no fígado ou doenças cardiovasculares em parentes próximos aumenta o risco.

Como reforça a médica Casey Means, “incrivelmente poucos médicos pedem insulina de jejum” — mesmo sendo um exame simples, barato e informativo.

Olhar para esse conjunto de marcadores permite detectar a resistência insulínica antes que ela apareça nos exames tradicionais.

E quanto mais cedo você souber, maior a chance de intervir e mudar o rumo.

Prevenção, acompanhamento e a importância do olhar individualizado

A resistência insulínica é um processo silencioso e multifacetado. Como vimos, ela não apenas antecede o diabetes tipo 2, como também aumenta o risco de doenças cardiovasculares, câncer e neurodegeneração.

Por isso, a melhor estratégia é agir antes. O que a ciência recomenda? Advinha.

  • Alimentação com menor carga glicêmica

  • Atividade física

  • Sono, estresse e descanso como pilares metabólicos

  • Exames que vão além da glicose

  • Tenha sempre acompanhamento médico individualizado

  • E, quando necessário, medicamentos seguros e eficazes

“Se você é resistente à insulina e suas células beta conseguem compensar, talvez nunca desenvolva diabetes. Mas a hiperinsulinemia pode causar danos silenciosos em outros órgãos, como coração e cérebro.” — Dr. Ralph DeFronzo

Prevenir disfunção metabólica é investir em longevidade.

Olhar para os marcadores certos, agir cedo e contar com orientação qualificada faz toda a diferença.

O segredo é simples: não espere adoecer para cuidar da sua saúde.

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