“Durmo 6 horas (ou menos) e me sinto ótimo!” — Será?

O que a ciência mostra sobre a crença de que alguém precisa de pouco sono

Bom dia. O número de corridas de rua não para de crescer: só em 2024 foram 743 provas na cidade de São Paulo — mais de duas por dia. Neste domingo, uma das provas mais conhecidas, a SP City Marathon, ocupa as ruas.

A corrida talvez seja o esporte mais democrático e acessível que existe, mas, mesmo se você não gostar, alcançar pelo menos 7 mil passos por dia já pode transformar sua saúde.

🔎 RESUMO DA EDIÇÃO DE HOJE (TL;DR)

🥱 O mito do “super-humano do sono”: Dormir 6 horas (ou menos) e se sentir bem pode parecer vantagem, mas a ciência mostra que só uma minoria raríssima tem essa genética. Para todos os outros, o preço da privação de sono aparece nos riscos cardíacos, metabólicos e no envelhecimento acelerado.

🧬 Complemento ou suplemento? O nutricionista Lázaro Medeiros explica a diferença  e como, na prática clínica, o segredo da longevidade está no equilíbrio e na personalização, não em cápsulas para tudo.

🌞 Luz solar, mitocôndrias e visão: Um novo estudo revela que até ondas de luz atravessando roupas podem turbinar as mitocôndrias e melhorar a saúde ocular, reforçando por que o sol da manhã é insubstituível.

💡 Notícias da semana: Vacina universal de mRNA elimina tumores em camundongos. Físico de 90 anos será o primeiro humano a receber transplante experimental de mitocôndrias. OpenEvidence capta US$ 210 mi e atinge 40% dos médicos dos EUA. IA revela benefício oculto em teste de Alzheimer. FDA notifica Whoop por medir pressão arterial sem aprovação.

📚 Vale Saber: “O sono não é só um pilar da saúde; é o alicerce. Quando ele falha, tudo desmorona — da alimentação ao DNA.” (Matthew Walker)

CIÊNCIA DO SONO

“Durmo 6 horas (ou menos) e me sinto ótimo!” — Será?

Você já ouviu (ou até já disse): “Eu durmo 6 horas, acordo bem e pronto. Não preciso de mais.” Mas será mesmo? Ou será que estamos subestimando o preço de viver com menos sono?

Essa crença é tão comum que virou quase um símbolo de produtividade. Só que, para quase todo mundo, a matemática biológica não permite esse “atalho”. Existem sim raríssimas exceções: pessoas com mutação no gene DEC2, que literalmente nasceram para precisar de menos sono. Elas produzem mais orexina, um neuropeptídeo que nos mantém acordados, e, por isso, conseguem funcionar bem dormindo apenas 5 horas por noite. Só que a chance de carregar essa mutação é tipo a mesma chance que ganhar na Mega Sena. Pois é!

Para o restante de nós, dormir menos de 7 horas traz consequências reais, progressivas e documentadas em estudos de alta qualidade.

O que a ciência já mostrou sobre dormir pouco

Doenças cardiovasculares: Adultos com 45 anos ou mais que dormem menos de 6 horas por noite têm 200% mais risco de sofrer um ataque cardíaco ou derrame ao longo da vida, em comparação com quem dorme sete a oito horas. A privação de sono afeta diretamente a pressão arterial e acelera o envelhecimento das artérias.

Diabetes tipo 2: Bastou uma semana dormindo apenas 4 horas por noite para que jovens saudáveis se tornassem 40% menos eficientes na absorção de glicose. Nos exames, os voluntários passaram a apresentar sinais claros de pré-diabetes.

Obesidade e regulação hormonal: Dormir pouco desregula profundamente hormônios da saciedade e fome, aumentando em 300 calorias o consumo diário médio e favorecendo o desejo por doces, carboidratos e alimentos salgados (preferência aumentada de 30-40%).

Sistema imunológico: Uma única noite de 4 horas de sono já elimina 70% das células Natural Killer, responsáveis por combater infecções e tumores. O impacto é tão profundo que a Organização Mundial da Saúde classificou o trabalho noturno como “provável carcinógeno”.

Alterações genéticas e envelhecimento: Dormir pouco por apenas uma semana modifica a atividade de 711 genes, incluindo genes ligados à inflamação, resposta ao estresse e doenças cardiovasculares. Também há evidências de danos aos telômeros, estruturas que protegem nosso DNA e se desgastam mais rápido quando o sono é insuficiente.

Perda de massa muscular durante dietas: Em experimentos, pessoas em dieta que dormiam menos de 6 horas perderam 70% do peso como músculo, enquanto quem dormia bem perdeu principalmente gordura.

Depressão e ansiedade: Dormir menos de 6 horas por noite multiplica o risco de depressão por 2,5 vezes e aumenta em mais de 20% o risco de sintomas de ansiedade, depressão. Uma única noite mal dormida já é suficiente para elevar significativamente os sintomas de ansiedade e reduzir as emoções positivas.

Mas… “Eu me sinto bem dormindo pouco!”

Aqui entra uma armadilha biológica. A sensação de que “está tudo bem” é traiçoeira. O cérebro privado de sono é ruim em avaliar o próprio desempenho. Vários estudos mostraram que, mesmo acreditando estar “ok”, a performance mental, emocional e até o tempo de reação estão comprometidos.

Matt Walker, junto com Eric Topol, resume bem: “A probabilidade de você ser um short sleeper genético é menor do que ser atingido por um raio.”. O mais seguro é dormir pelo menos 7 horas todas as noites.

No futuro, e a corrida já começou, talvez a ciência descubra uma forma de “zipar” o sono sem consequências, mas, até lá, não vale apostar na sorte. O sono é o maior seguro de vida de baixo custo que existe. Priorize 7 horas ou mais por noite. Seu corpo, seu cérebro e sua longevidade agradecem.

PALAVRA DO ESPECIALISTA

Complemento x suplemento. Qual o melhor no contexto da longevidade?

Escrito por Lázaro Medeiros

Você já parou para pensar por que tantas pessoas tomam suplementos e ainda assim se sentem cansadas, inflamadas ou com baixa performance?

Em tempos de pílulas para tudo, é fácil cair na ilusão de que suplementar é sempre sinônimo de saúde. Mas, na prática, o que seu corpo precisa pode não ser mais uma cápsula e sim uma estratégia personalizada. E é aí que entra a diferença entre complementar e suplementar.

Complementar significa corrigir uma carência ou apoiar uma necessidade fisiológica específica, identificada com base em exames, sintomas ou condições clínicas. Já suplementar muitas vezes é adicionar algo por precaução ou que ofereça um benefício a mais dentro da nossa saúde.

Tomar vitamina D no inverno, por exemplo, pode ser um complemento necessário caso seus níveis estejam baixos no exame de sangue. Já a suplementação é uma estratégia que só tem viabilidade quando as carências nutricionais são corrigidas, vou usar o mesmo exemplo da vitamina D: dependendo da dosagem, é possível ampliar o efeito da vitamina D (que inicialmente funciona em um contexto do metabolismo ósseo mas que pode apresentar um impacto importante na saúde muscular, imunidade e até no inflammaging).

O paradoxo da longevidade em cápsulas

A ciência é clara: longevidade depende de um organismo adaptável, funcional e com inflamação sob controle. E alguns suplementos podem, sim, ajudar nesse processo — desde que utilizados com propósito e critério.

Alguns estudos mostram, por exemplo, que:

  • Ômega-3 pode reduzir riscos cardiovasculares e inflamatórios

  • Magnésio está relacionado à função mitocondrial e melhora do sono

  • Vitamina D impacta o sistema imune e a saúde óssea

Mas isso não significa que todos precisam dessas substâncias o tempo todo. A chave é entender o momento biológico e metabólico de cada pessoa.

Genética, idade e estilo de vida: por que a necessidade muda

Com o passar dos anos, nosso corpo sofre alterações na absorção, produção e utilização de nutrientes. Além disso, variantes genéticas (como no gene MTHFR, envolvido no metabolismo de folato, ou o FADS1, que afeta conversão de ômega-3) podem aumentar a necessidade de certos micronutrientes.

Pessoas sob estresse crônico, atletas ou indivíduos em processo de emagrecimento, por exemplo, têm demandas bioquímicas específicas que precisam ser respeitadas.

E é nesse momento que a suplementação, dentro do contexto da personalização, pode ser o detalhe que falta na sua jornada de longevidade.

Como saber se você precisa complementar?

Aqui vão passos práticos para tomar decisões mais seguras:

  1. Faça exames laboratoriais regulares: Avalie vitamina D, B12, ferritina, magnésio, zinco, homocisteína e PCR-us (proteína C reativa ultrasensível), entre outros. Exemplo: uma homocisteína elevada pode indicar necessidade de B12 ativa e folato — com risco aumentado para doenças cardiovasculares.

  2. Considere testes genéticos preditivos: Genes como MTHFR, COMT, BCMO1, FUT2 ajudam a entender sua capacidade de metabolizar vitaminas e compostos bioativos. Testes de nutrigenética já estão acessíveis no Brasil.

  3. Avalie sua rotina e sintomas: Sono ruim, baixa energia, memória fraca ou imunidade baixa são sinais de alerta. Um profissional pode ajudar a conectar esses sintomas ao estado nutricional.

  4. Evite poli suplementação aleatória: Mais não é melhor. Alguns nutrientes competem entre si na absorção (como ferro e zinco). Outros, como o cálcio, podem interferir em medicamentos. Eu sempre recomendo a ideia de que o suplemento é uma resposta para cada pergunta que nosso corpo faz. A suplementação também pode trazer sobrecargas se o seu metabolismo não necessita dela e pode até acelerar o processo de envelhecimento.

E então: vale a pena?

Quando bem estabelecida e apoiada pela ciência e por bons profissionais, a suplementação é um apoio que pode reforçar nossa jornada rumo a uma longevidade equilibrada. Na prática clínica e na literatura científica, os melhores resultados aparecem quando suplementos entram como ferramenta complementar a um estilo de vida saudável e uma alimentação de qualidade. Eles não substituem sono, movimento, vínculo social e bons hábitos, mas potencializam tudo isso, quando bem usados.

Se você deseja viver mais e melhor, use o suplemento de forma inteligente. Seu corpo não precisa de tudo. Ele ele precisa de equilíbrio.

HÁBITOS DO DIA A DIA

O amplo impacto da luz solar

Já está bem estabelecido: a luz solar é um dos maiores “remédios” naturais para saúde, longevidade e performance. A ciência mostra, há anos, que ela regula o relógio biológico, impacta o humor, fortalece o sistema imune, otimiza a produção hormonal e melhora até a tomada de decisão. Não à toa que o Andrew Huberman coloca “expor-se à luz solar nas primeiras horas do dia” entre os cinco pilares básicos de saúde e longevidade.

O Novo Estudo: Infravermelho próximo e efeitos sistêmicos

Um novo estudo publicado este mês mostrou algo muito interessante. Pesquisadores do Reino Unido descobriram que certos comprimentos de onda da luz solar em especial o infravermelho próximo (830 a 860 nanômetros) são capazes de atravessar tecidos humanos, inclusive roupas comuns, e gerar efeitos benéficos muito além do que imaginávamos.

O experimento é doido: voluntários foram expostos a luz de 850 nm, tanto de forma natural (sol) quanto por painéis de LED, direcionada apenas nas costas, com a cabeça completamente coberta por papel alumínio para evitar contato com os olhos. O resultado? Vinte e quatro horas depois, esses participantes apresentaram melhora significativa na sensibilidade visual, especialmente na distinção de cores. O ganho chegou a 16% em certas faixas de cor, e mesmo com a cabeça protegida o efeito foi estatisticamente relevante.

A explicação está na biologia das mitocôndrias. Essas organelas que são especialmente abundantes na retina e têm uma curiosa sensibilidade à luz de comprimentos longos. Quando expostas a esse tipo de luz, as mitocôndrias aumentam a produção de ATP (energia celular), melhorando o funcionamento dos tecidos, inclusive à distância. É um efeito chamado abscopal: o estímulo da luz na pele ativa um efeito sistêmico que repercute inclusive em regiões distantes, como os olhos.

Retinas, Envelhecimento e Saúde Visual

Por que isso é relevante? A retina é um dos tecidos do corpo com maior concentração de mitocôndrias e uma das primeiras regiões a sofrer com o envelhecimento. O declínio do metabolismo mitocondrial na retina está ligado à piora progressiva da visão, especialmente na sensibilidade ao contraste de cores, aquela capacidade de distinguir objetos em fundos parecidos, fundamental para a vida real, mas que vai se perdendo com a idade.

O novo estudo mostrou que, ao estimular as mitocôndrias com luz infravermelha, mesmo distante dos olhos, é possível melhorar essa função visual de maneira consistente e mensurável. Não por acaso, a literatura já vinha sugerindo efeitos semelhantes em animais. A exposição a comprimentos de onda entre 660 e 1000 nm não só melhora o metabolismo energético, mas também reduz inflamação e protege contra danos associados à idade.

Ambientes Modernos: Um desencontro evolutivo

Outro ponto fundamental: os ambientes fechados e a iluminação artificial moderna, dominada por LEDs, cortam exatamente esses comprimentos de onda. A luz artificial das casas e escritórios privilegia a faixa azul e praticamente elimina o infravermelho, criando um desencontro evolutivo entre a luz para a qual nosso corpo evoluiu e a que recebemos hoje.

E mais: roupas comuns, mesmo em várias camadas, são surpreendentemente transparentes para a luz de 850 nm. Ou seja, mesmo vestido, você ainda pode colher parte desse benefício, mas apenas se estiver sob o espectro solar completo, algo que nenhuma lâmpada doméstica oferece.

O Sol completo é insuperável

O estudo reforça um ponto central para quem busca saúde e longevidade. Não basta se proteger do excesso, é preciso garantir a exposição certa. Você não precisa passar horas ao sol para colher esses benefícios e nem deve. Tanto o novo estudo quanto as recomendações de especialistas mostram que 15 minutos de exposição diária à luz solar já são suficientes para estimular as mitocôndrias e favorecer a saúde ocular e metabólica. Sempre que possível, escolha horários em que o sol está mais baixo, como nas primeiras horas da manhã. O espectro total do sol é insubstituível, e seus benefícios vão além da vitamina D ou do relógio biológico. Eles estão nas mitocôndrias, na visão, no metabolismo, na energia vital de cada célula.

NOTÍCIAS

O que mais está acontecendo?

💡 OpenEvidence, app médico de crescimento mais rápido da história, capta US$ 210 milhões e atinge US$ 3,5 bi em valor. Usado diariamente por 40% dos médicos dos EUA, o OpenEvidence lança o DeepConsult, seu primeiro agente de IA especializado em medicina, e fecha parcerias com AMA e NEJM. A empresa já suporta mais de 8,5 milhões de consultas clínicas por mês nos EUA.

💡 Físico de 90 anos será o primeiro humano a receber transplante experimental de mitocôndrias. O professor John G. Cramer vai participar de um estudo pioneiro da Mitrix Bio para testar mitocôndrias cultivadas em laboratório na reversão do envelhecimento celular. O projeto, que também busca outros voluntários acima de 55 anos, pode abrir caminho para terapias de renovação mitocondrial em humanos.

💡 Vacina universal de mRNA contra o câncer mostra resultados promissores em camundongos. Pesquisadores da Universidade da Flórida criaram uma vacina genérica que, combinada à imunoterapia, eliminou tumores resistentes em modelos animais. A abordagem estimula o sistema imune de forma ampla e pode abrir caminho para uma vacina universal. O próximo passo será testar em humanos.

💡 IA revela benefício oculto em teste fracassado de Alzheimer. Um novo modelo de IA separou pacientes em grupos de progressão lenta ou rápida. Ao reanalisar um estudo com lanabecestat, o tratamento desacelerou em 46% a doença no grupo lento—um efeito oculto na análise tradicional. Isso mostra como análises mais personalizadas podem revelar a real eficácia de tratamentos antes descartados.

💡 FDA notifica Whoop por medir pressão arterial em pulseira sem autorização, reacendendo debate sobre wellness vs. dispositivo médico. A Whoop alega que o recurso é só para bem-estar, não diagnóstico, mas o FDA discorda, citando risco e uso clínico da métrica. O caso destaca o desafio regulatório de definir limites entre wellness e saúde, e o impacto na inovação de wearables.

VALE SABER

“De maneira mais ampla, a longevidade exige uma mudança de paradigma na medicina, que oriente nossos esforços para a prevenção de doenças crônicas e o aumento do nosso healthspan. E isso precisa ser posto em prática agora, em vez de esperarmos que uma doença se instaure ou que nossas capacidades física e cognitiva estejam comprometidas. Não é uma medicina “preventiva”; é uma medicina proativa, e acredito que tem o potencial não apenas de mudar a vida de todos, como também de aliviar muito do sofrimento que nossa sociedade de modo geral vivencia. Essa mudança também não virá do establishment médico; ela só vai ocorrer se e quando os pacientes e médicos exigirem.”

— Fonte: Dr. Matt Walker

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