É indiscutível que a saúde metabólica é a bola da vez, desde os agonistas de GLP-1 (Ozempic e outros) até novas empresas de biotecnologia que estão transplantando mitocôndrias para tratar doenças raras e devastadoras.

Dentro desse vasto e promissor universo, existem algumas intervenções que não custam nada, literalmente zero, que podem ajudar. Entre elas, uma hipótese tem ganhado atenção: será que a ordem dos alimentos no prato — com os carboidratos deixados para o final — pode ajudar no controle glicêmico?

A princípio, parece uma ideia lógica. Afinal, ordem e forma importam em tantas áreas da vida, por que seria diferente no prato? Mas será que a ciência confirma isso? Vamos aos fatos.

O estudo: o que ele analisou?

Uma pesquisa publicada em 2024 se propôs a testar essa hipótese em um experimento de 16 semanas com 39 adultos com pré-diabetes e sobrepeso. O objetivo era observar se a ordem dos alimentos no prato — proteínas e vegetais primeiro, carboidratos por último — impactaria marcadores metabólicos como glicemia (HbA1c), peso corporal e ingestão alimentar.

Os participantes foram divididos em dois grupos:

  1. Grupo Controle: Seguiu orientações nutricionais padrão, como controle de porções e escolhas saudáveis.

  2. Grupo Intervenção: Recebeu as mesmas orientações, mas foi instruído a consumir vegetais e proteínas antes dos carboidratos em cada refeição.

E qual o resultado?

Foram mistos. Não houve diferenças significativas nos principais marcadores metabólicos avaliados, como glicemia de longo prazo (HbA1c). No entanto, o grupo que consumiu carboidratos por último apresentou um aumento no consumo de proteínas e vegetais, o que pode trazer benefícios indiretos para a saúde.

Curto prazo vs. longo prazo

Estudos anteriores, como o de 2015 publicado na Diabetes Care, mostraram que, em pacientes com diabetes tipo 2 (DM2), consumir carboidratos por último reduziu os picos glicêmicos em até 29%, 37% e 17% nos primeiros 30, 60 e 120 minutos, respectivamente, em comparação com o consumo dos carboidratos primeiro.

Outro estudo de 2016 reforçou essa ideia em pacientes com DM2, ao mostrar que manipular a ordem dos alimentos durante 8 semanas resultou em uma redução significativa na glicemia pós-prandial, na variabilidade glicêmica e nos níveis de HbA1c. No entanto, esse estudo apresenta potenciais problemas metodológicos que podem comprometer a validade desses resultados.

No estudo de 2024, realizado com participantes com pré-diabetes, os resultados não replicaram esses benefícios diretos a longo prazo. Isso pode ser explicado pela diferença nas condições metabólicas entre os grupos: enquanto pessoas com DM2 têm disfunções metabólicas mais severas, indivíduos com pré-diabetes podem responder de forma menos pronunciada a intervenções alimentares.

Por que o estudo não mostrou impacto significativo?

Existem algumas hipóteses para explicar os resultados:

1. Adesão limitada: Apenas 33% dos participantes do grupo intervenção seguiram a prática “quase sempre”.

2. Dieta geral: O grupo controle também recebeu orientações nutricionais e melhorou a qualidade da dieta no geral, o que pode ter mascarado possíveis diferenças.

3. Duração do estudo: A maioria das pesquisas que mostram benefícios se concentra no curto prazo, e o impacto a longo prazo pode depender de fatores adicionais, como consistência na prática de atividade física.

Qual a mensagem final?

Embora a prática de consumir carboidratos por último tenha seus méritos para atenuar picos glicêmicos momentâneos, os dados disponíveis não suportam que essa estratégia traga benefícios metabólicos relevantes e diretos a longo prazo, especialmente para pessoas com pré-diabetes.

Ainda assim, a abordagem pode ser útil de forma indireta. O aumento no consumo de proteínas e fibras que foi visto no grupo intervenção pode ajudar a melhorar a qualidade da dieta, aumentar a saciedade e, potencialmente, reduzir o consumo de carboidratos.

Além disso, como mostram os estudos com pacientes com DM2, a estratégia pode ter benefícios específicos para indivíduos com disfunções metabólicas mais avançadas. Para pessoas saudáveis e em estágios iniciais, como o pré-diabetes, os efeitos podem ser mais dependentes da adesão e do contexto geral da dieta.

Se você ficou curioso, pode testar essa abordagem por um período e avaliar os resultados de forma personalizada. Cada organismo é único, e essa abordagem pode funcionar de maneiras diferentes para cada pessoa. Meça seu peso, níveis de glicemia, como você se sente e outros biomarcadores no médio prazo para observar como seu corpo reage. Afinal, não custa nada essa mudança. E lembre-se, fale sempre com um nutricionista.

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