Mulheres têm o dobro de risco de desenvolver Alzheimer — mas a ciência ainda não sabe por quê

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Duas em cada três pessoas com Alzheimer são mulheres. Por muito tempo, acreditou-se que isso era apenas consequência da maior expectativa de vida feminina. Mas essa explicação já não se sustenta.

Se as mulheres vivem, em média, apenas 4,5 anos a mais que os homens, por que o risco de Alzheimer nelas é mais do que o dobro? A verdade é que a ciência ainda não tem uma resposta definitiva — e isso escancara mais uma falha histórica na pesquisa sobre a saúde feminina.

Assim como abordamos na edição anterior da Longevidade News, as mulheres vivem mais, mas passam mais anos com saúde comprometida. E o Alzheimer pode ser o maior símbolo desse paradoxo.

O que a ciência sabe até agora?

Novas pesquisas começam a apontar que o risco elevado de Alzheimer nas mulheres pode estar ligado a três principais fatores:

  1. Menopausa e metabolismo cerebral → A menopausa é um período crítico para o cérebro feminino. O estrogênio, além de seu papel na reprodução, é essencial para a captação de glicose pelas células cerebrais. Com sua queda, o cérebro entra em uma "crise energética", podendo levar à neurodegeneração.

  2. Fatores metabólicos e cardiovasculares → A saúde metabólica tem um peso maior no risco de Alzheimer feminino. Pressão alta, resistência à insulina e disfunção lipídica parecem ser mais impactantes para mulheres do que para homens.

  3. Influências sociais e estruturais → Diferenças históricas no acesso à educação e ao trabalho intelectual podem impactar a proteção cognitiva ao longo da vida, reduzindo a chamada "reserva cognitiva", um dos principais fatores que retardam o declínio neurológico.

O cérebro feminino na menopausa: um gatilho para Alzheimer?

Um estudo publicado recentemente na Nature Medicine reforça que a menopausa pode ser um dos principais gatilhos biológicos do Alzheimer. Usando exames de imagem de ressonância magnética e PET Scan, pesquisadores identificaram que:

  • Mulheres na menopausa apresentam 22% menos metabolismo cerebral do que homens da mesma idade.

  • A quantidade de placas beta-amiloides, um marcador da doença de Alzheimer, é 30% maior nas mulheres.

  • O cérebro feminino pode estar consumindo sua própria substância branca como fonte de energia, acelerando o processo de neurodegeneração.

Lisa Mosconi, neurocientista e uma das autoras do estudo, reforça:

"O Alzheimer não é uma doença da velhice. É uma doença da meia-idade, cujos sintomas só aparecem na velhice."

Isso significa que a prevenção do Alzheimer precisa começar décadas antes dos primeiros sintomas.

Terapia de Reposição Hormonal (TRH): solução ou risco?

A relação entre menopausa e Alzheimer também levantou uma questão polêmica: a Terapia de Reposição Hormonal (TRH) pode ajudar a reduzir o risco da doença?

Segundo a pesquisadora Roberta Brinton, estudos sugerem que:

  • Mulheres que fazem TRH por pelo menos 3 anos têm um risco 40% menor de desenvolver Alzheimer.

  • Esse número sobe para 60% em mulheres que fazem TRH entre 3 e 6 anos.

  • E pode chegar a 80% em quem faz TRH por mais de 6 anos.

Por outro lado, algumas pesquisas indicam que iniciar a TRH tarde demais pode aumentar o risco. E ainda veja o que a professora Michelle Mielke comenta:

“É importante destacar que a menopausa é uma fase natural e que ela não causa a doença de Alzheimer. Os médicos não devem prescrever terapia hormonal para a menopausa apenas para prevenir a demência, mas mulheres com sintomas menopáusicos podem usá-la sem problema.”

Isso gera um baita problema: sem consenso, muitas mulheres ficam sem informação suficiente para tomar decisões.

Alzheimer também é uma doença social

O estudo também reforça que o risco de Alzheimer feminino vai muito além do biológico.

  • Mulheres que tiveram menos acesso à educação formal apresentam maior risco de demência.

  • Trabalho intelectual e estímulo cognitivo ao longo da vida são fatores protetores contra a doença.

  • Mulheres que vivem em regiões com altos índices de desigualdade de gênero têm um declínio cognitivo mais acelerado.

Ou seja, o Alzheimer feminino é uma doença que nasce da interação entre biologia, sociedade e história.

O que precisa mudar?

Apesar de as mulheres representarem 64% dos casos de Alzheimer no mundo, apenas 12% do financiamento global para pesquisas em demência é direcionado para estudos focados nelas.

Se queremos mudar esse cenário, algumas ações são urgentes:

  1. Mais pesquisas focadas no cérebro feminino: As diferenças biológicas precisam ser estudadas de forma mais profunda.

  2. Diretrizes claras para a TRH: Mulheres precisam de informação baseada em evidências para decidir sobre o uso de hormônios.

  3. Prevenção precoce: O Alzheimer começa na meia-idade. Monitorar fatores de risco deve ser parte dos check-ups de saúde feminina.

  4. Reconhecimento do impacto social e econômico: Longevidade não é apenas viver mais, mas viver com qualidade.

O fato é: A ciência e a longevidade também precisam ser pensadas levando em conta as diferenças entre os sexos.

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