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O jejum: Além da ciência
7 minutos de conteúdo sobre como viver mais e melhor

Nutrição é um tema complexo e cheio de controvérsias, principalmente pela dificuldade de conduzir estudos científicos que possam nos afirmar, com precisão, um caminho correto.
Quando falamos sobre longevidade, esse desafio se intensifica. Afinal, é praticamente impossível fazer com que um grupo de pessoas siga um determinado padrão alimentar por décadas para comprovar seus efeitos.
Por isso, muitas pesquisas buscam respostas em modelos alternativos, analisando padrões alimentares influenciados por culturas, religiões e hábitos históricos. Nesse contexto, o jejum tem sido um dos temas mais estudados e debatidos na ciência da longevidade.
Mas o que a ciência realmente diz? O jejum é benéfico apenas porque reduz a ingestão calórica, ou há outros mecanismos envolvidos? Antes de responder, precisamos separar essas duas abordagens distintas:
Jejum como ferramenta de restrição calórica, auxiliando no controle de peso e metabolismo.
Jejum como ferramenta para melhorar biomarcadores de longevidade, independentemente da quantidade total de calorias ingeridas.
O que se sabe até agora?
A ideia de que comer menos pode prolongar a vida é antiga, mas ganhou embasamento científico robusto nas últimas décadas. Estudos com diferentes espécies, de leveduras a primatas, demonstram que reduzir a ingestão calórica pode aumentar a longevidade e retardar o aparecimento de doenças.
A restrição calórica sem desnutrição (em inglês, CR) é um método amplamente estudado. Em seu livro o Peter Attia menciona que pesquisas desde a década de 1930 mostram de forma consistente que camundongos submetidos à CR podem viver de 15% a 45% mais do que aqueles que comem à vontade, dependendo da idade de início e do grau de restrição.
Mas um detalhe importante chamou atenção: muitos desses experimentos envolvem não apenas a redução de calorias, mas também a restrição do período de alimentação — ou seja, os animais acabam involuntariamente praticando um tipo de jejum.
Isso levanta a questão: os benefícios vêm da menor ingestão calórica ou do intervalo sem comer?
Um estudo recente, conduzido pelo pesquisador Joe Takahashi e mencionado por Satchin Panda, tentou responder essa pergunta. Ele comparou três grupos de camundongos:
Comiam à vontade o dia todo (sem restrição calórica).
Tinham restrição calórica, mas comiam pequenas a cada 90 minutos.
Tinham restrição calórica, mas comiam todas as calorias dentro de um intervalo de 12 horas durante o horário que eles naturalmente comem (de noite).
Os camundongos do segundo grupo (restrição calórica sem jejum) viveram 10% mais do que os do primeiro grupo. Já os do terceiro grupo (restrição calórica + janela de alimentação) viveram 35% mais.
O que significa? Nada de novo! Pois vamos parar para pensar, quem é que come o tempo todo, mesmo durante o sono? Normalmente comemos dentro de uma janela de 12-14 horas.
A questão mais interessante é: e se, ao invés de comer em 12 horas, os camundongos comessem todas as calorias dentro de uma janela de apenas 2 horas? Aqui entra um outro dado curioso. De acordo com um estudo mencionado por Satchin Panda, não houve diferença significativa entre uma janela de 12 horas e uma de 2 horas. Ou seja, reduzir ainda mais o tempo de alimentação dentro do dia não trouxe benefícios adicionais claros.
Biomarcadores
O que é o mais intrigante é que o Dr. Satchin comenta, que ao comparar os grupos 2 e 3 utilizando biomarcadores clássicos de longevidade, os pesquisadores não conseguiram prever que o grupo 3 teria uma vida mais longa. Ou seja, ainda precisamos identificar novos biomarcadores mais sensíveis para avaliar os reais impactos do jejum na extensão da vida.
O que podemos aprender com tudo isso
Apesar de não estar claro cientificamente que apenas o jejum tem um benefício claro (excluindo da conta a questão de redução calórica), ele pode ser uma grande ferramenta para ajudar a reduzir o consumo de calorias. O que tem grandes benefícios.
Por quê? Pelo mesmo motivo que a Ramamicina tem um efeito em nossa longevidade. Comer menos também ativa a enzima AMPK, que estimula a biossíntese de mitocôndrias e inibe o mTOR (lembra do nosso artigo sobre isso?). Essa inibição desencadeia a autofagia, um processo essencial para reciclagem celular, removendo componentes danificados e melhorando a função das células ao longo do tempo.
Mas há algo além da biologia.
A ciência ainda não tem todas as respostas sobre o impacto do jejum e talvez nunca tenha, mas essa é uma prática milenar central em diversas culturas e religiões, principalmente nas tradições abraâmicas. Nessas tradições, o jejum não era apenas um período diário de pausa alimentar como é o jejum intermitente tradicional, mas sim um período de abdicação e reflexão, no qual a atenção se voltava menos ao corpo.
Seja pela ciência ou pela espiritualidade, me parece que momentos específicos de abdicação sempre tiveram e terão um papel essencial na vida humana.
P.S
Este artigo foi escrito ao longo de uma semana e estava pronto desde o final de semana passado. Nesse meio tempo, Rich Roll compartilhou a segunda conversa que teve com o Dr. Valter Longo, que é um dos especialistas em jejum e longevidade. Ainda não analisei, mas fica a dica caso alguém queira assistir.
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