Somos aficionados pelo “como”. Como dormir melhor? Como aumentar o VO₂max? Como diminuir o colesterol? Como melhorar o sono?

Faz parte. O problema é que, cedo ou tarde, chega o momento em que perguntamos: por quê? E essa é a pergunta que todos nós deveríamos encarar de frente.

Dentro do que compõe esse “por quê”, a busca pela felicidade é parte clara da equação. Todo mundo busca a felicidade, sem exceção, mas aí mora uma questão: a grande maioria não sabe nem definir o que é felicidade. Veja o que o pesquisador de Harvard Arthur Brooks escreveu:

“O que as pessoas querem dizer quando dizem que ‘querem ser felizes’? Geralmente, duas coisas: primeiro, estão dizendo que querem alcançar (e manter) certos sentimentos — alegria, contentamento ou algo semelhante. Segundo, estão dizendo que há algum obstáculo para alcançar esse sentimento. ‘Quero ser feliz’ quase sempre é seguido de ‘mas…’. A verdade é que ambas as crenças, por mais persuasivas que pareçam, são falsas.”

E é mesmo complexo definir felicidade. Desde a Antiguidade, filósofos debatem o tema. Por isso muitos começam pelo que não é felicidade e evoluem daí — o conceito matemático da inversão (Fun fact: Em lógica, é muito mais fácil provar que a raiz de 2 é irracional assumindo que é racional e mostrando o absurdo. Essa prova é muito elegante). Como então podemos “achar” algo que nem sabemos o que é?

O que os estudiosos falam?

Uma coisa é clara: felicidade não é emoção. Emoções podem ser, no máximo, evidências. Isso é reconfortante por um lado, porque, assim, conseguimos estudar felicidade e desenvolver na prática. O que o Arthur Brooks propõe é que não dá para ser feliz completamente; dá para ser mais feliz. Felicidade não é destino, é direção. Muito parecido com o amor: amor é ação, mesmo quando o sentimento ainda não chegou.

Brooks, resumindo décadas de estudo, descreve um tripé que precisa estar balanceado para sermos mais felizes:

  1. Apreciação — Muito além do prazer. A busca pelo prazer superficial é frágil e pode levar a vícios. Apreciação é prazer com comunhão e consciência. Um jantar pode dar prazer; jantar com amigos traz apreciação.

  2. Satisfação — A sensação de progresso ou de atingir um objetivo. Importa ter havido esforço real e “trapacear” não funciona. Aprender algo novo, melhorar em algo, conseguir uma promoção e etc. O ponto de atenção: satisfação é efêmera e, sem atenção, vira perseguição incessante. É tema inclusive da música dos Stones “(I can’t get no) Satisfaction". 

  3. Propósito — O mais importante dos três. Tema que tratamos muito aqui na newsletter. Sem propósito, não enfrentamos os dilemas da vida e os percalços diários acabam sobrepujando nossos objetivos. Com sentido, como escreveu Viktor Frankl, conseguimos, mesmo nas situações difíceis, encontrar paz interior e esperança.

Nenhum dos três pilares vem sem esforço e sacrifício. Coisas boas exigem custo no curto prazo. Por isso é impossível desassociar felicidade de algum nível de infelicidade, felicidade e infelicidade caminham juntas. Felicidade não é ausência de infelicidade! Ao buscar apreciação, satisfação e propósito, passamos por momentos duros que nos ensinam. O desafio é lidar com as emoções que vêm de carona. Talvez o maior ensinamento de Frankl seja este: a maior liberdade que temos é escolher como reagir ao que o mundo nos apresenta. Tomar uma decisão consciente sobre o que fazer.

No que então mirar?

Há milhares de estudos e livros sobre o tema. Brooks sugere, com base em décadas de pesquisa, quatro pilares que, na prática, sustentam uma vida boa:

  1. Família — Pessoas que geralmente não escolhemos (com exceção do cônjuge). Onde se aprende presença, responsabilidade e perdão.

  2. Amigos — Relações de amor e confiança que pedem investimento ativo. Amizade não sobrevive no piloto automático.

  3. Trabalho — Atividade remunerada ou não, na qual você gera valor para os outros e para si. Esforço, utilidade e contribuição.

  4. Espiritualidade — Uma visão transcendental da vida que organiza o caos do imediato e sustenta propósito.

Esses pilares não removem os desafios, pelo contrário, mas nos dão uma outra perspectiva sobre como olhar para os problemas que vão aparecer. Eles alimentam o tripé (apreciação, satisfação e propósito).

E você? Está confundindo prazer com apreciação? Está trocando satisfação por validação? Seu propósito depende do humor do dia ou está ancorado em algo que você considera verdadeiro, mesmo quando dói? Essas são perguntas que você, eu e todos os outros temos que fazer.

A virada está não em perseguir felicidade, mas em construí-la no dia-a-dia. Rituais com quem você ama. Projetos com começo, meio e fim que exigem esforço real. Um trabalho que seja realizador. Um tempo diário para olhar para algo maior do que você. Isso produz direção.

No fim das contas, felicidade não é um ponto de chegada. É uma orientação de vida. Você não acorda “feliz para sempre”. Você escolhe, dia após dia, os blocos que sustentam uma vida que vale a pena. Quando vierem as perdas, e elas virão, você terá base. Quando vierem as conquistas, e elas virão, saberá recebê-las sem se perder.

Longevidade é isso: a união do “como”, que aprendemos aqui semanalmente com ciência e experiência, e do “por quê”, que traz sentido para o que decidimos no curto prazo, em prol de uma vida longa, saudável e feliz.

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